sábado, 26 de março de 2011


Carlos Drummond de Andrade




Infância 
A Abgar Renault 


Meu pai montava a cavalo, ia para o campo. 
Minha mãe ficava sentada cosendo. 
Meu irmão pequeno dormia. 
Eu sozinho menino entre mangueiras 
Lia a história de Robinson Crusoé. 
Comprida história que não acabava mais. 


No meio-dia branco de luz uma voz que aprendeu 
a ninar nos longes da senzala – e nunca se esqueceu 
chamava para o café 
Café preto que nem a preta velha 
café gostoso 
café bom. 


Minha mãe ficava sentada cosendo 
olhando para mim: 
- Psiu... Não acorde o menino. 
Para o berço onde pousou um mosquito. 
E dava um suspiro... que fundo! 


Lá longe meu pai campeava 
no mato sem fim da fazenda. 


E eu não sabia que minha história 
era mais bonita que a de Robson Crusoé

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