Print version ISSN 1516-4446
Rev. Bras. Psiquiatr. vol.30 suppl.2 São Paulo Oct. 2008
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-44462008000600006
ARTIGOS
Terapia cognitivo-comportamental de transtornos de abuso de álcool e drogas
Bernard P RangéI; G Alan MarlattII
IPrograma de Pós-Graduação em Psicologia, Instituto de Psicologia, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro (RJ), Brasil
IICentro de Pesquisa em Comportamentos Adictivos, Universidade de Washington, EUA
RESUMO
OBJETIVO: Entre os diversos tipos de tratamentos aos quais as terapias cognitiva e comportamental têm sido aplicadas com sucesso encontra-se o uso em problemas de adicção. Este artigo, em parte, revê modelos de adicção como os de prevenção de recaídas de Marlatt e Gordon, o de Prochaska, DiClemente e Norcross sobre os estágios de mudança, com a derivação da entrevista motivacional, desenvolvida por Miller e Rollnick, bem como os modelos cognitivos de Beck et al.
MÉTODO: Com base em evidências da literatura para o desenvolvimento de programas de tratamento efetivos, é descrito um modelo de tratamento em grupo que foi usado com grupos de alcoolistas encaminhados pela Divisão de Vigilância da Saúde do Trabalhador da Universidade Federal do Rio de Janeiro para o Centro de Pesquisa e Reabilitação do Alcoolismo.
RESULTADOS: Os resultados são apresentados indicando que este tipo de tratamento poderia ser uma alternativa a outros tratamentos em uso.
CONCLUSÕES: Novas pesquisas são necessárias para validar melhor a abordagem cognitivo-comportamental para os problemas de abuso de álcool e drogas.
Descritores: Fobia social; Terapia cognitivo-comportamental; Timidez; Ansiedade; Transtornos relacionados ao uso de substâncias
Introdução
Transtornos relacionados a substâncias geralmente causam prejuízos importantes e complicações graves, resultando em deterioração da saúde geral do indivíduo, além de produzir efeitos negativos nos contextos pessoal, social e profissional. O consumo repetido de altas doses de álcool pode afetar quase todos os sistemas orgânicos, principalmente o trato gastrointestinal e os sistemas cardiovascular e nervoso (déficits cognitivos, déficit de memória grave e alterações degenerativas no cerebelo).
A dependência e o abuso de álcool representam um grande problema de saúde pública. Mesmo os melhores tratamentos para o alcoolismo apresentam prognósticos pouco favoráveis, e o prognóstico para pacientes com maior cronicidade é ainda menos favorável.
A Associação Americana de Psiquiatria (APA) estabeleceu critérios diagnósticos para abuso e dependência de substâncias.1
Critérios para abuso de substância do DSM-IV
A. Um padrão mal-adaptativo de uso de substância levando ao prejuízo ou sofrimento clinicamente significativo, manifestado por um (ou mais) dos seguintes aspectos, ocorrendo dentro de um período de 12 meses:
• uso recorrente da substância, resultando em um fracasso em cumprir obrigações importantes relativas a seu papel no trabalho, na escola ou em casa
• uso recorrente da substância em situações nas quais isto representa perigo físico
• problemas legais recorrentes relacionados à substância
• uso continuado da substância, apesar de problemas sociais ou interpessoais persistentes ou recorrentes
B. Os sintomas jamais satisfizeram os critérios para Dependência de Substância.
Critérios para dependência de substância do DSM-IV
Padrão mal-adaptativo de uso de substância, levando ao prejuízo ou sofrimento clinicamente significativo, manifestado por três (ou mais) dos seguintes critérios, ocorrendo a qualquer momento no mesmo período de 12 meses:
1) tolerância, definida por qualquer um dos seguintes aspectos:
a) uma necessidade de quantidades progressivamente maiores da substância para adquirir a intoxicação ou efeito desejado
b) acentuada redução do efeito com o uso continuado da mesma quantidade de substância
2) abstinência, manifestada por qualquer dos seguintes aspectos:
a) síndrome de abstinência característica para a substância
b) a mesma substância (ou uma substância estreitamente relacionada) é consumida para aliviar ou evitar sintomas de abstinência
3) a substância é freqüentemente consumida em maiores quantidades ou por um período mais longo do que o pretendido
4) existe um desejo persistente ou esforços mal-sucedidos no sentido de reduzir ou controlar o uso da substância
5) muito tempo é gasto em atividades necessárias para a obtenção da substância (por ex., consultas a múltiplos médicos ou fazer longas viagens de automóvel), na utilização da substância (por ex., fumar em grupo) ou na recuperação de seus efeitos
6) importantes atividades sociais, ocupacionais ou recreativas são abandonadas ou reduzidas em virtude do uso da substância
7) o uso da substância continua, apesar da consciência de ter um problema físico ou psicológico persistente ou recorrente que tende a ser causado ou exacerbado pela substância (por ex., uso atual de cocaína, embora o indivíduo reconheça que sua depressão é induzida por ela, ou consumo continuado de bebidas alcoólicas,embora o indivíduo reconheça que uma úlcera piorou pelo consumo do álcool)